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UEL: Indígenas ainda enfrentam obstáculos na vida acadêmica

19/04/18 às 09:36 - Escrito por Bruna Satsuki Tukamoto
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“O dia 19 de abril é um dia de resistência. Um dia de luta. É quando, por um instante, a sociedade se lembra de nós, indígenas. Porque nos demais dias, somos esquecidos, ignorados.” É assim que Alexandro da Silva, 30, define o Dia do Índio. Natural da etnia Guarani Nhandewa, ele saiu da Terra Indígena Laranjinha em 2016 para ingressar na Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Antes, Silva já cursara administração na Universidade Estadual de Maringá (UEM). “Mas eu não consegui me adaptar lá. Enfrentei preconceito, dificuldade com disciplinas de cálculos e um choque cultural muito forte. Repeti de ano algumas vezes e em 2013, desisti do curso. Dois anos depois, decidi prestar o Vestibular Indígena na UEL por conta de um diferencial. Desde 2014, a universidade oferece o Ciclo Intercultural de Iniciação Acadêmica para estudantes indígenas. Isso foi determinante para que eu buscasse uma vaga na UEL”, relembra.

Não só para Silva, o ciclo introdutório também costuma ser decisivo para outros indígenas que se preocupam com o processo de adaptação na UEL. De acordo com Wagner Amaral, professor do departamento de Serviço Social e membro da Comissão Universidade para os Índios (CUIA) da UEL, na época, as estatísticas mostravam um índice de retenção muito grande dos estudantes indígenas no primeiro ano de curso. O Ciclo surgiu para mudar essa dinâmica. “A lógica é basicamente um ano de graduação na universidade. Os seis ingressantes indígenas da UEL ficam juntos na mesma sala e ao longo desses meses, os conteúdos ajudam a desenvolver a oralidade acadêmica desses estudantes, bem como o acesso à leitura e à escrita acadêmica”, explica o professor. Além disso, os alunos também participam de eventos, congressos, conhecem o campus e criam uma agenda de aproximação com o curso que pretendem estudar. No fim do ano, devem apresentar uma média de desempenho.

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Para Amaral, esses aprendizados oferecidos pelo Ciclo fazem toda a diferença na trajetória acadêmica do indígena. Prova disso é a experiência de Silva, que ingressou em Ciências Sociais e está no segundo ano do curso “O Ciclo me ajudou muito na questão de trabalhos acadêmicos, normas, escrita. Também tive a oportunidade de estudar disciplinas específicas, como matemática, ciências da natureza e português. O melhor é que tudo é integrado com a cultura indígena.”

No entanto, apesar do Ciclo Intercultural colaborar na adaptação dos indígenas na UEL, os estudantes se deparam com outros obstáculos durante a graduação, que podem contribuir com a desistência. Amaral aponta a questão financeira como uma das principais dificuldades enfrentadas pelos alunos, já que o auxílio permanência oferecido para os indígenas nem sempre atende todas as necessidades. Outra complexidade é a mudança da aldeia para Londrina. Muitas vezes, a adaptação na cidade não é tão simples. 

Uma terceira barreira ainda enfrentada pelos indígenas é o preconceito. Reclamação bastante comum entre os alunos. “A universidade não foi criada para eles, tampouco para as populações afrodescendentes e pobres. Na UEL, existem desde preconceitos mais velados até os mais explícitosIsso se dá devido à tamanha ignorância presente no ambiente universitário, que reforça um estereótipo do indígena carregado de desprestígio”, avalia o membro da CUIA.

Uma das possíveis maneiras de mudar este cenário é a presença cada vez mais forte de índios no ensino superior, o que tem ocorrido. A procura pela graduação aumentou muito nos últimos anos. O primeiro Vestibular dos Povos Indígenas do Paraná foi realizado em 2002 e contou com 54 candidatos. No último, que aconteceu no fim do ano passado, foram registrados cerca de 700. E segundo a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI), atualmente, a UEL possui 39 alunos indígenas matriculados.

Os dados são muito positivos e mostram uma busca cada vez maior dos jovens às universidades, o que para Silva, representa muito para a população indígena. “Vejo a universidade como um ponto estratégico para nossas futuras lutas, porque estamos em um ambiente de aprendizagem, que nos permite falar sobre política, criar novos líderes, novos profissionais. Até porque nada é melhor do que um indígena representar ele mesmo. Quero que venha mais indígenas para a UEL, para a UEM. Onde tiver universidade, que haja indígenas, porque é um espaço nosso, que temos que ocupar. Assim, conquistaremos, futuramente, mais voz dentro da sociedade.”

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