Paraná

Estado deve reassumir gestão do Hospital Regional do Noroeste, em Paranavaí

28 jun 2018 às 14:40

O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) determinou à Secretaria da Saúde do Estado do Paraná (Sesa) que apresente, no prazo de 90 dias, um plano de ação para o encerramento da cessão do Hospital Regional do Noroeste à Santa Casa de Paranavaí. Esse prazo passará a contar a partir do trânsito em julgado do processo, no qual cabe recurso.

A Santa Casa ainda deverá comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias desde março de 2014 e o pagamento ou parcelamento de débitos previdenciários pelas empresas Baena & Siriani Ltda., contratada para prestar serviço de plantão no pronto-socorro; e Abraão & Lanza Ltda., contratada para prestar serviço de plantão na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de adultos, sob pena de instauração de Tomada de Contas Extraordinária.

A decisão foi tomada no julgamento de Relatório da Auditoria que analisou as transferências voluntárias realizadas entre a Sesa e a Santa Casa de Paranavaí, decorrentes da celebração dos termos de convênio números 41/2011, 69/2011, 186/2012, 23/2013, 54/2013, 65/2013 e 94/2013, referentes aos exercícios financeiros de 2011, 2012 e 2013, no valor total R$ 11.382.978,21.

Os convênios tinham por objeto a aquisição de equipamentos para a ampliação da UTI neonatal, além da estruturação do serviço de oftalmologia e de um arco cirúrgico (equipamento de raio-x utilizado em cirurgias), ambos destinados à Santa Casa de Paranavaí. Também foram realizados repasses de recursos para a conclusão do Hospital Regional do Noroeste, a construção de rampas entre os setores do hospital e a manutenção da instituição.

No relatório, a equipe de auditoria apontou as seguintes irregularidades:  terceirização do serviço público de saúde a entidade privada, sem que tenha ocorrido a simples complementariedade; cessão indevida de unidade hospitalar, com a utilização de equipamentos públicos para finalidade particular; e falta de retenção de contribuições previdenciárias de prestador de serviço de mão de obra.

 

Legislação e doutrina

A participação da iniciativa privada na execução do orçamento público, especialmente na área da saúde, vêm sendo tema recorrente na doutrina administrativista. O estabelecimento de vínculos jurídicos entre o Estado e entidades filantrópicas, com a intenção de fomentar o desenvolvimento de ações de interesse público, é instituto histórico que teve muitas vezes sua utilização desvirtuada, para que se realize terceirização de serviços públicos essenciais, em flagrante tentativa de burla às regras do Direito Público.

O Acórdão nº 680/06 do Pleno do TCE-PR estabeleceu que "não pode ser objeto de vínculos externos a cessão total de unidades de assistência à saúde e hospitalares (capacidade instalada), as quais devem ser objeto de gestão própria por vínculos internos". 

O parágrafo 1º do artigo 199 da Constituição Federal assegura a participação da iniciativa privada, de forma complementar, mediante contrato de direito público ou convênio, no Sistema Único de Saúde (SUS). A Lei nº 8080/90, conhecida como Lei Orgânica da Saúde, dispõe, em capítulo próprio, sobre essa participação complementar; e o artigo 24 dessa lei estipula que o SUS somente poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada quando as suas próprias disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área.

O constituinte previu duas formas para participação do particular no SUS: por meio da contratação de serviços e por meio de convênio, para o atendimento à demanda social selecionada pela Constituição.

O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou as premissas em relação à celebração do contrato de gestão para a formalização de convênio, como a qualificação da entidade como organização social (OS) e os requisitos que legitimam essa execução indireta dos serviços públicos. Simples dificuldades ordinárias não autorizam a transferência da gestão. É necessário demonstrar que haverá ganho de eficiência, o que permite ao poder público direcionar a atuação do particular, em uma relação de fomento, com a imposição de deveres (metas) e a competência fiscalizatória dos órgãos de controle externo.

O STF destaca, ainda, que os atores públicos e privados devem participar e colaborar entre sim, sem que haja mera delegação de serviços, com a obrigatoriedade de que ocorra o processo de qualificação da entidade e o procedimento público de chamamento para a celebração dos ajustes.

Em outras palavras, não se permite a mera cessão do bem público, pois ainda que haja a cessão de bens e até mesmo servidores à OS, o Estado permanece atuante na administração e na fiscalização do contrato. Portanto, a constitucionalidade do modelo não garante a celebração de todo e qualquer contrato de gestão, de forma desregrada e desmotivada, sendo plenamente cabível o controle de mérito sobre o ato administrativo que optar pela execução indireta dos serviços públicos.

 

Decisão

O relator do processo, conselheiro Nestor Baptista, afirmou que é impossível conceber que a transferência do Hospital Regional do Noroeste à gestão da iniciativa privada, por meio de simples instrumento de convênio, obedeça ao comando da complementariedade inerente ao SUS. Ele destacou que é preciso considerar, também, que o Estado do Paraná já possui legislação que estabelece seu Programa de Organizações Sociais (Lei Complementar Estadual nº 140/2011).

Baptista ressaltou, ainda, que o Relatório de Auditoria apontou a ausência de retenção da contribuição do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre os serviços médicos prestados na instituição pelas empresas Baena & Siriani Ltda. e Abraão & Lanza Ltda., ambas contratadas para prestação de serviços com fornecimento de mão de obra.

O conselheiro destacou que o contador da Santa Casa de Paranavaí informou que as empresas haviam apresentado declaração informando que não era necessário reter a contribuição, tendo em vista que os serviços de plantões médicos eram prestados pelos sócios das empresas. Mas essas declarações não foram apresentadas, em contrariedade ao disposto no parágrafo 2º do artigo 148, Instrução Normativa (IN) nº 971/2009.

O relator afirmou que as empresas que prestam serviços de plantões médicos, mediante cessão de mão de obra, não se enquadram na exceção prevista no inciso III do artigo 148 da IN 971/2009. Além disso, os documentos das licitações realizadas para a contratação das empresas em questão - pregões presenciais números 1/2012 e 2/2012 - evidenciam que os seus sócios não estão contemplados integralmente nas escalas de plantões médicos.

Finalmente, Baptista frisou que, apesar de os interessados terem informado que haviam tomado todas as medidas necessárias para o saneamento da irregularidade, tendo notificado as empresas contratas para que tomassem as providências para recolher as contribuições previdenciárias devidas e comprovar que realizaram o recolhimento a partir de março de 2014, tais fatos não são suficientes e não foram comprovados no processo.

TCE-PR

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